terça-feira, 29 de abril de 2014

Conquistas Perigosas (The Necessary Death of Charlie Countryman)

A fórmula para se contar uma historia fantástica ou lúdica com perfeição está na combinação de diversas variáveis, mas não estou me arriscando quando digo que as únicas que são realmente essenciais são a sua complexidade (uma fantasia deve ser fácil e compacta como o que resta de um sonho em nossas memórias), a sua mágica (deve distorcer a realidade que assistimos) e sua humanidade (deve aproximar-se ao máximo da realidade que vivemos). Os surrealistas e expressionistas que distorciam estéticas em função de subjetividades, se arriscavam a repetir o que lhes restava dos sonhos que abandonam as nossas memórias. Nem surrealista, nem expressionista, Conquistas Perigosas é um sonho moderno e artificial que, infelizmente, beira o palpável.

Como sugere o titulo americano do filme, a morte de Charlie se afirma inevitável logo no início, em uma cena de "flashes" que resume bem a estética do filme. Ao som de um piano leve e calmo, que  é interrompido por um disparo, o protagonista balança sobre um abismo. Com a vida dependente de uma corda que, por sua vez, depende de mãos desconhecidas pela câmera, Charlie espera a sua morte eminente. Em flashes, a apresentação do filme alterna seu espaço de tela com a mão que segura a corda, com o corpo que por ela é segurado, com a água no fim do abismo que espera para engolir o corpo pendurado e, por fim, pelo mergulho aparentemente necessário de Charlie Countryman. Tudo acontece em uma linda fotografia minuciosamente planejada que valoriza luzes artificiais e cores controladas acompanhada de músicas, tão primorosamente escolhidas quanto, exatamente como se constrói esteticamente todo o resto do filme.


O filme conta a história de Charlie Countryman, um turista despretensioso (Shia Labeufem Bucareste na Romênia, que se apaixona por Gabi Ibanescu, uma linda violoncelista (Evan Rachel Wood) e por essa paixão expressa ele se compromete a desafiar Nigel (Mads Mikkelsen), um gangster violento e ex-namorado de Gabi. Mas, além disso, o inusitado filme de Fredrik Bond também conta a historia de Charlie Countryman, um jovem que, sofrendo com recente rompimento de um namoro, tem que suportar a eutanásia de sua mãe em coma. Nesse ponto da criação, o roteirista deve ter parado e pensado "E agora? Como eu vou fazer para ligar essas histórias?" e a resposta veio para ferir o filme. Charlie é um médium que, ao conversar com a mãe morta, decide viajar, sem planejamento algum, para Bucareste. A caminho da Romênia ele conhece o pai de Gabi que morre no voo e lhe incumbe indiretamente de conhecer a sua filha, permitindo assim que a história siga o seu rumo e praticamente ignore a dádiva do protagonista.



Conquistas Perigosas é um filme compacto e simples que, sem se aprofundar em seus personagens, nem explorar backgrounds, conta uma história de amor simples e crível, combinando uma paixão intensa - não pela situação caótica na qual se criou, mas pela beleza e leveza transmitidas entre o jovem casal - uma comédia fácil, mas divertida (com o surpreendente carisma do ex-Rony Weasley de Harry Potter) e frenéticas sequências de ação, tudo muito bem acompanhado das músicas mais adequadas. Nos quesitos complexidade e humanidade, o diretor nos oferece um lindo sonho semi-trágico que entende o espectador e não requisita o estudo da obra. Já no quesito fantasia, é oferecida a beleza deslumbrante de uma cidade decadente, luzes inexistentes, músicas que completam a experiência e as lógicas criadas por seus personagens, nas quais, infelizmente, a mágica literal ou a fé espírita não são aceitas. Conquistas Perigosas nunca veio a ser um sonho, na verdade, não passou de um delírio de um roteirista desvirtuado.

NOTA: א א א א א א